sábado, novembro 5

Grafite em Goiânia.











Essas fotos foram tiradas de grafites realizados na Praça Universitária de Goiânia no mês de Setembro de 2011.


Não temos apenas que ver essa imagens, é preciso interpretar sua mensagem sem preconceitos ou conceitos.

Mesmo que não tenhamos controle, toda produção humana reproduz os pensamentos e anseios humanos que muitas vezes não conseguimos exprimir racionalmente.

Cada enfoque pode mudar todo o conceito da foto e impedir sua identificação na praça onde foram tiradas.

Infelizmente não foi possível localizar a autoria de cada cenário.

sexta-feira, outubro 21

Eu Não Pedi Pra Nascer

Minha mão pequena bate no vidro do carro
No braço se destacam as queimaduras de cigarro
A chuva forte ensopa a camisa, o short
Qualquer dia a pneumonia me faz tossir até a morte
Uma moeda, um passe me livra do inferno,
Me faz chegar em casa e não apanhar de fio de ferro
O meu playground não tem balança, escorregador
Só mãe vadia perguntando quanto você ganhou
Jogando na cara que tentou me abortar
Que tomou umas cinco injeções pra me tirar
Quando eu era nenê tento me vender uma pá de vez
Quase fui criado por um casal inglês
Olho roxo, escoriação, porra, que foi que eu fiz?
Pra em vez de tá brincando tá colecionando cicatriz
Porque não pensou antes de abrir as pernas,
Filho não nasce pra sofrer, não pede pra vir pra Terra.

O seu papel devia ser cuidar de mim, cuidar de mim, cuidar de mim
Não me espancar, torturar, machucar, me bater, eu não pedi pra nascer.

Minha goma é suja, louça sem lavar,
Seringa usada, camisinha em todo lugar
Cabelo despenteado, bafo de aguardente `
É raro quando ela escova os dentes
Várias armas dos outros moqueadas no teto
Na pia mosquitos, baratas, disputam os restos
Cenário ideal pra chocar a UNICEF,
Habitat natural onde os assassinos crescem
Eu não queria Playstation, nem bicicleta
Só ouvir a palavra "filho" da boca dela
Ouvir o grito da janela "A comida tá pronta",
Não ser espancado pra ficar no farol a noite toda
Qualquer um ora pra Deus pra pedir que ele ajude
A ter dinheiro, felicidade, saúde
Eu oro pra pedir coragem e ódio em dobro
Pra amarrar minha mãe na cama, pôr querosene e meter fogo.

O seu papel devia ser cuidar de mim, cuidar de mim, cuidar de mim
Não me espancar, torturar, machucar, me bater, eu não pedi pra nascer.

Outro dia a infância dominou meu coração,
Gastei o dinheiro que eu ganhei com um álbum do Timão
Queria ser criança normal que ninguém pune,
Que pula amarelinha, joga bolinha de gude
Cansei de só olhar o parquinho ali perto,
Senti inveja dos moleque fazendo castelo
Foda-se se eu vou morrer por isso,
Obrigado meu Deus por um dia de sorriso.
À noite as costas arderam no couro da cinta,
Tacou minha cabeça no chão
Batia, Batia, me fez engolir figurinha por figurinha
Espetou meu corpo inteiro com uma faca de cozinha
Olhei pro teto e vi as armas num pacote,
Subi na mesa, catei logo a Glock
Mãe, devia te matar, mas não sou igual você,
Em vez de me sujar com seu sangue eu prefiro morrer....

O seu papel devia ser cuidar de mim, cuidar de mim, cuidar de mim
Não me espancar, torturar, machucar, me bater, eu não pedi pra nascer.

Artista: Facção Central


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quarta-feira, outubro 12

Cabelo branco é sinônimo de decência?


Naturalmente que hoje em dia todos nós temos que pegar filas. Seja para pagar o pão na padaria, pegar senha para o pagamento, para o atendimento nas filas do governo. Em fim, nas muitas situações cotidianas nos deparamos com a questão de ceder espaço e prioridade para os mais velhos. O consenso social é o de que quem tem cabelo branco merece mais preferência. Eu aprendi assim quando pequeno, acredito, assim como todas as pessoas.

Pois bem, estava numa fila dessas da vida, quando percebi que a mesma não “andava”, ou seja, estava a 10 minutos no mesmo lugar. Foi quando me estressei e resolvi falar. Tomei a iniciativa de verificar o que estava ocorrendo. Analisando bem a situação, notei pessoas de cabelo branco passando a frente. Perguntei a uma senhora se ela havia pegado fila, disse que não, afirmei que já estava em pé a quase 15 minutos. Jocosamente ela me disse que não precisava me preocupar que nada iria acabar. Responde que não se tratava de tempo, mas de respeito.

Conversando com outras pessoas, percebi o quão isso tem sido normal. Temos cedido lugar a pessoas que possuem cabelos brancos, mas não possuem censo ético ou respeito. Aquela atitude sensata que temos a tendência de esperar dos mais velhos é na verdade algo esquecido. Muitas empresas aproveitam da preferência dessas pessoas para colocá-las em filas com o propósito de ser atendido mais rápido e garantir maior eficiência em seus serviços e ganhar mais, é claro.
  
Analisando melhor depois acabei me lembrando de várias situações em que algumas pessoas de forma corruptiva se aproveitam desse beneficio social. Senhoras e senhores que ranzinzamente exigem o cumprimento do respeito que nem sempre merecem, mas por conta dos cabelos brancos e de rugas, conseguem quase tudo. Como diz Fernanda Young, o olhar de um homem de 80 anos não deve comover a ninguém, pois esse mesmo pode ter sido um sacana quando mais novo.

A deputada do Estado de São Paulo, Cidinha Campos, em um de seus inflamados discursos, afirmou que a corrupção esta no sangue do povo brasileiro. Isso me fez pensar, e hoje, me fez ter ligação com essas situações da preferência aos mais velhos. Até a chamada melhor idade se aproveita de forma corruptiva, antiética e imoral os benefícios a ela delegadas. Não é isso que esperava encontrar nos mais velhos.

Para não deixar o leitor com a impressão de que um dia teremos todos que nos imanar na corrupção para sobreviver nesse país, acrescento que, conforme Martin Luter King, “O que mais preocupa não é o grito dos violentos, nem dos corruptos, nem dos desonestos, nem dos sem ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons.” Portanto, gritem e reclamem sempre que o bom senso for desconsiderado. 

terça-feira, setembro 27

Quem sou eu? E você quantos é?



Goiânia, 24 de setembro. Tempo frio e lá fora cai chuva. São 18:00 horas e nesse momento ouço - ou melhor, entro em êxtase - com o som da banda Apocalyptica . Estou em casa e, como todo jovem da minha idade, vou fazer, pela primeira vez, meu Orkut. Para ser sincero não queria fazer esse troço, mas meus amigos me falaram que é legal. Você conhece muitas garotas, etc. Tudo ok, já criei minha conta, só falta agora escrever algumas coisas sobre mim. Nome: Alan Ricardo, idade: 19 anos, cidades: Goiânia/Iporá, fuma: não, bebe: não... Uai, que pergunta é essa aqui: quem sou eu?


Hum. Que pergunta difícil. Esse pessoal do Orkut poderia perguntar outra coisa, como, por exemplo, do que você gosta, ou melhor, o que você tem... Mas vem logo perguntar: quem sou eu? Acho que isso é fácil de responder. Vou colocar a letra de uma música famosa ou um pequeno poema e está resolvido o problema. Mas seria melhor mentir. Quem sabe colocar um monte de coisas sobre minha personalidade... Será que estarei, na verdade, mentido? 

Afinal, todos nós mentimos. A mentira está ligada à intencionalidade. Uma coisa é cometer erros e outra bem diferente é ter intenção de mentir. Os erros ocorrem, na maioria das vezes, distantes das relações sociais. Já a mentira é circunstanciada por uma relação social que tenho com o outro. Pensando assim, posso perguntar: sou obrigado a mostrar aos outros tudo que sou, e assim me caracterizar para qualquer um? Se a mentira é, com efeito, uma relação social, compreende-se que minha relação com os outros está liga (primeiramente ) ao vínculo que tenho e/ou quero ter com outra pessoa. Não sou obrigado a publicar meus gostos, ou mesmo, quem sou na realidade, pois as relações que tenho com os outros (e, porque não dizer comigo mesmo) determinam se quero ou não ser transparente. Quando estou mentindo devo meditar, portanto, se estou construindo a relação que  desejo. Mas, o que isso importa? Isso que acabei de falar repete o formalismo de nossa sociedade, não é? Hoje todos querem é ter (Ter é Ser, e Ser é Ter). 

Quem não tem nada, consequentemente, nada é e nada tem para oferecer. No conto infantil: O Pequeno Príncipe, não se pergunta se as pessoas são felizes, mas sim o que tem, qual seu status na sociedade, mas para não cair na areia movediça de reflexões puramente abstratas, de que sociedade estamos falando? É claro, da sociedade capitalista.


Em sua música o repista DJ. Alpiste vociferava que “para você que tem dinheiro tudo é fácil, tá empregado, terminou a primeira faculdade (de Direito, Medicina e seja a bosta que for), tá com um carro zero na garagem, filhos, (...) quanta diferença entre nós dois, mas me diga: se dinheiro é o nome do jogo, se você não tem você é como um tolo, mas não adianta ter educação, quando a meia noite chegar o ladrão”, conclui o repista.

Indo adiante, Marx (1983), analisando o poder do dinheiro na sociedade capitalista, conclui de forma irônica que o que eu sou e posso fazer não é determinado pela minha individualidade. Afinal o que isso significa? Se uma pessoa é feia, poderia comprar a mais bela mulher. Consequentemente, não sou é feia, pois o efeito da feiura é anulado pelo dinheiro. Se é coxo, o dinheiro proporciona quantas pernas quiser; logo deixa de ser coxo. Na realidade das coisas isso é estúpido, mas como poderá o dono do dinheiro ser estúpido, já que o dinheiro é tudo, coisa que nem a traça e ferrugem podem corromper? O dinheiro é o bem supremo, e por isso seu possuidor é bom. 

Internauta, por incrível que pareça, essa pergunta do Orkut está me fazendo meditar em muitas coisas que, até então, estavam encapuzadas. Só que isso não basta para me esclarecer, preciso saber, de fato, se as mentiras são necessárias. Pensando melhor a respeito da mentira, ela pode ser (positivamente) salvadora, garante nossa sobrevivência, mesmo que por um dia. Mas aqui não se trata da mentira conforme os moldes cristãos. Subjetivamente, nós gastamos energias psíquicas monstruosas para conseguirmos viver a cada dia não sendo atormentados pela consciência (Ou inconsciente, segundo Freud) que temos. 

Vivemos, a cada dia, o perigo de tudo dar errado. Isso opera no fundo de nosso psiquismo, temos um mecanismo para manter a estrutura funcionando para garantir que essa consciência não venha à tona. Porque se essa consciência vier à tona, a demanda de sobrevivência que temos, provavelmente, não conseguirá sobreviver frente a demanda de sobrevivência bruta. Ficamos paralisados diante desse pânico. Esse pânico é embutido em nossa experiência de adaptação. Pensando desse modo, a mentira (Mentira caracterológica segundo o psicanalista Ernest Becker) é boa, pois nos ajuda a sobreviver nesse mundo infernal. Se, num único dia (Por exemplo, hoje, na minha tentativa de mentir para o Orkut) conseguir mentir, consequentemente, vou garantir minha sobrevivência. Mas quem não mentir fica paralisado diante do inexorável e do terror que é a existência.

Que Porra, depois de tanto teorizar e refletir sobre quem sou eu não consegui, de fato, me caracterizar. Quem sou eu? Afinal, o que os antigos pensavam em relação ao Ser (Quem sou eu), ou para ser mais específico: o que é o ser? Sabemos que se trata de um verbo, eu sou; tu és; ele é....

Segundo a filósofa Márcia Tiburi, os primeiros filósofos problematizaram a existência, os chamados pré-socráticos, questionavam o princípio fundamental da existência. Para Tales seria a água, para Anaxímenes e Diógenes, seria o ar, enquanto para Hipásio e Heráclito seria o fogo. Para Parmênides a existência era algo imutável e imóvel e que nunca poderia ser conhecida. Para Aristóteles a existência é o Ser, mas ele se apresenta de modo abstrato e intransitivo. 

Falar do ser é como se estivéssemos falando do nada. Se associarmos o Ser com a existência ficamos confusos, pois se penso em minha experiência, me coloco em questão. Podemos pensar a existência de um jeito simples, não é preciso recorrer a muita coisa: assim, pelo simples fato de existir dentro do meu próprio corpo, de fazer uma experiência concreta, da minha própria individualidade, sendo que não posso ser outra pessoa e que, portanto, estou condenado a ser eu mesmo e que quando falo me torno eu mesmo; somente assim posso falar da existência. Pensar a existência - ou, quem sou eu - está relacionado, sobremaneira, pela própria concepção que tenho de minha existência.

Mas a existência, conforme Márcia Tiburi, pode significar uma doença. Doença? Não estamos caindo num pessimismo tosco? Aliás, em nossa cultura o pessimismo sofre certo preconceito, o pessimista é taxado como ruim, mas, de outro lado, o otimista é visto como o bonzinho. Que falta de noção, né? Para Freud, o mal-estar é inerente à condição humana; a humanidade, pensando desse modo, está fadada a ser infeliz, ao menos, a não gozar de uma felicidade plena. Nós somos - virtualmente - inimigos da cultura; se procuramos, com todas as forças, sermos felizes, essa mesma felicidade é momentânea. A felicidade torna-se algo raro, enquanto de outro lado, a infelicidade é constante e frequente.

Mais adiante, o filósofo Arthur Schopenhauer (2005), nos avisa que nenhuma felicidade duradoura pode ser atingida na vida, que se move, como um pêndulo, entre a dor e o aborrecimento. O ideal seria, nesse sentido, negar nossa vontade, não-ser. Schopenhauer, em uma máxima, afirma que: "A essência da existência é a dor". Mas, nesse contexto, o que é a dor? A dor advém de uma experiência que antecipa a morte. A dor não vem do simples fato de não realizarmos nossos desejos, mas vem a todo momento. Experimentamos a todo instante a morte como um suicídio existencial lento. Mas se trata da morte como algo distinto, uma ameaça futura, em que um dia, todos, morreremos. Digo da morte no sentido mais próximo, de pequenas antecipações prévias que sentimentos a todo instante em nosso desgraçado cotidiano. 


A cada realização de nosso querer encontramos,como paradoxo, o tédio, aborrecimento, desejo satisfeito, mas que, então, passamos a não sentir nada. Ou sofremos porque não realizamos nada ou porque realizamos tudo. Que paradoxal! É da condição humana não satisfazer? Não vivemos/existimos apenas no carnal. O carnaval (sim, essa festa que temos todos anos) nunca se realiza nesta compreensão, ela é impossível de se realizar como desejo pleno. Temos satisfações rápidas, mas não é para sempre. É da natureza da existência o sofrer, mas (infelizmente) não é da natureza da existência o gozo?! A felicidade – e o gozo momentâneo - vem em pequenas dozes, mantendo nossas esperanças que um dia a vida será boa(é bom que seja assim,portanto) Aquele que reflete as estruturas do mundo sabe que as coisas nunca serão boas .Ser feliz, isso sim, é um esforço ético (para Lacan o ser feliz é o bem dizer, é a aceitação da vida como ela é, vontade de fazer um mundo melhor , mesmo que a lei desse mundo seja ruim, )


Bebendo em Schopenhauer, o filósofo do século XIX, e em Friedrich Nietzsche (2001),  que nos mostram, categoricamente, a teoria do retorno. Para pensarmos qual o significado da vida no próprio contexto dela, deve-se pensar: será que teria coragem de viver tudo àquilo que já vivi? Será que olhando pra trás poderia repetir, momento a momento, cada segundo da minha existência? Será que poderia viver tudo novamente com o prazer e dor que experimentei? Aquele que consegue dizer sim ao seu próprio passado é um indivíduo que conseguiu superar a doença (Ora, o que é a doença? É a dor de existir, mas que não tira nossa vontade de existir por completo; é a dor de viver, contrabalanceada, pela própria dor de viver)


Depois dessas longas e cansativas reflexões, ainda, não sei me definir. Quem sou eu? Coisa que nem os filósofos, em toda sua intelectualidade e experiência, não conseguiram responder. Dificilmente vou respondê-la. Opa, já são 23:30 da madrugada. Vou dormir; tenho aula amanhã. Depois contínuo, quem sabe, a responder essa pergunta (Se não responder agora, vou levá-la para o resta da minha vida). Concluindo minhas breves reflexões, lanço a pergunta de Dom Juan: quem você quer que eu seja?


Beijo, tchau e me liga!


Referências Bibliográficas:




BECKER, Ernest. A negação da Morte. Rio de Janeiro, Record, 2007.



FREUD, S. El malestar en La cultura. Obras Completas. Buenos Aires: Amorrortu Editores, Vol 21, p-57-140,1998.



MARX, Karl. Manuscritos Econômico- Filosóficos. In: FROMM, Erich. O Conceito Marxista do Homem. 8a edição, Rio de Janeiro, Zahar, 1983.



NIETZSCHE, Friedrich. Humano, demasiado humano. São Paulo: Cia. das Letras,

2000, p. 272.



_________________. A gaia ciência. São Paulo: Cia. das Letras, 2001, p. 64-65;



PRECHT, Richard David. Quem sou eu? E, seu sou, quantos sou?Uma aventura na filosofia. São Paulo: Ediouro,2009.



RIBEIRO, Renato J. O que é mentir ? In: Revista de Filosofia Ciência e Vida, n° 34 ano 2009.



SCHOPENHAUER, A. O mundo como vontade e como representação, 1º tomo; Tradução, apresentação, notas e índices de Jair Barboza. São Paulo: Editora UNESP, 2005.



_________________El mundo como voluntad y representación, 2º tomo (complementos); introdução, tradução e notas de Pilar López de Santa Maria. In: Coleção Clássicos de la cultura; Madri: Editorial Trotta SA, 2005.



TIBURA, Márcia. A existência como doença. Café filosófico. Disponível em : http://www.cpflcultura.com.br/site/2009/01/28/inacao-existencia-como-doenca-marcia-tiburi/



VIANA, Nildo. Universo Psíquico e Reprodução do Capital: ensaios freudo-marxistas. São Paulo: Escuta, 2008.

______________Ser, Ter ou Aparecer? Disponível em http://informecritica.blogspot.com/2010/11/ser-ter-ou-aparecer-nildo-viana-o-que.html.


_________ Os valores na Sociedade Moderna. Brasília, Thesaurus, 2007


_________. Inconsciente coletivo e Materialismo Histórico. Goiânia: Germial, 2002.

sábado, setembro 17

Novos Tempos



Durante certo tempo já se percebe diversas criticas ao que pode ser uma ameaça ao celibato moral da Sociedade. Trata da contraposição entre a cultura de certo modo antiga que menospreza a sensualidade, a diversidade e o que pode mostrar os podres da realidade tal qual se sabe que é e o Novo. Bilhares de criticas surgem de igrejas, correntes tradicionais do pensamento e da população mais velha, e o mais assustador, os mesmos jovens que se dizem o extremo da modernidade tem repulsa por tudo o que espelha diferença.

Muitos, senão todos, apontam o dedo e dizem que alguns cantores são contra os bons costumes, estão deturpando o bem estar ideológico e comum da sociedade. O entretenimento de hoje realmente apela para o que é comercial, no entanto não deixa de mostrar a realidade. Uma onda visual, ideológica e estética vem caminhando a passos largos atrasando ainda mais um modelo “certinho” de ser.

Videoclipes estão sensuais cheios de efeitos sonoros e visuais. As pessoas estão mais carnívoras, no sentido de que estão com sede de prazer e já não se limitam com regras morais que já estão sendo muito bem aplicadas a muito tempo. De repente aquela história de que tudo é previsível e repetidor por debaixo dos céus é ultrapassada.

Apenas estamos tendo acesso ao que a imaginação humana é capaz de produzir. Do que de fato o Humano é capaz, não tem nada a ver com manifestação demoníaca, impulso do sistema capitalista ou quebra das regras de comportamento tradicionais da sociedade. Pela primeira vez a coisa se mostra tal qual é possível, como sempre, mas com um grande diferencial, ora a inocência da inconsciência mobiliza ou a própria vontade de atingir objetivos claramente definidos.

Conheço muitas pessoas que se julgam assustadas com a quantidade de violência nos últimos tempos, e outros com o quanto a população se tornou destemida em relação aos relacionamentos morais e o numero de homossexuais que tem aparecido. Já outras que estão preocupadas mais com a última coleção do Georgio Armani ou da Chanel. Outra parcela de importa bastante com sua aparência, mas não come nada que preste e nem se preocupa em manter o equilíbrio.

Recebo e-mails criticando o tal programa BBB quando na verdade o programa é um sucesso. Podem não aceitar que por se tratar de algo extremamente comercial que expressa toda a realidade nacional e internacional seja um sucesso, quando na verdade não se trata de algo genuinamente inventado. O programa não chama a atenção porque foi uma vontade inventada e sim porque expressa as vontades, os interesses e a mentalidade de grande parcela da sociedade que ainda se assusta consigo mesma.

Alguns se julgam muito superiores e outros inabaláveis, simplesmente os donos da razão – se bem que não sei o porquê - mas acreditam que sua opinião não carece de amadurecimento ou análises diferentes. Mais uma vez repito que nada á anormal, talvez somente não aceitar que nossa raça, a humana, seja tão promiscua e ao mesmo tempo animal seja algo habitual para a maioria.

Repito muito que o pior cego é o que não quer ver. Quem sabe as coisas não são bem o que parecem. De repente ele não é bem o que se julga ser. Quem sabe a felicidade é possível de outra forma. Quem sabe não se trate somente da realidade de sempre. Que o tudo que se sabe existir esta apenas se mostrando de uma forma diferente.  

quinta-feira, setembro 1

Monstro Moderno



Menina dance até meus pés.
Se esfregue em mim.
Respire meu cheiro.
Fume uma carreira e fique louca.
Me dê seu C*.

Hey DJ, aumente o volume!!
Meu corpo precisa se mexer.
Não se assuste com meu jeito Calígula de ser.
Eu pago tudo. Sempre pago.

Quanto mais se entorpece mais me conduz ao prazer.
Na água azul e transparente da piscina me deleito vendo-a como uma puta louca. 
Vaca da moda.
Dinheiro, dinheiro, dinheiro.
Status, fama, política.

Faça-me dançar!
Faça meu pau subir.
Me lambuze.
Não jogue meu champanhe fora!
Agora lambe. 

Hei garoto, o que esta olhando?!
Sua cueca esta apertada?
Meus escravos do prazer.
Meus queridos idiotas.

Salário, preço, lucro.
Sem preconceitos, nem limites. Sem pudor.
Amanhã meu terno esta impecável.
Sou a perfeição da sociedade.

Mandar, receber, raciocinar.
Relógio de ouro, carro alemão, cadeira de aço.
Mandar matar, fugir, atirar.
Rosto de santo, olhos coloridos, cabelo perfeito.  

domingo, agosto 21

Muitas histórias dentro da História: o silêncio dos vencidos



Para estudar o passado de um povo, de uma instituição, de uma classe, não basta aceitar ao pé da letra tudo quanto nos deixou a simples tradição escrita. É preciso fazer falar a multidão imensa dos figurantes mundos que enchem o panorama da história e são muitas vezes mais interessantes e mais importantes do que os outros, os que apenas escrevem a história.” (Sérgio Buarque de Holanda)


“De 1964 a 1985 ocorreu no Brasil à ditadura militar. Esse período foi seguido pelo governo de cinco militares: Castelo Branco, Costa e Silva, Médici, Geisel e, por último, Figueiredo. São muitas as razões que levaram a instauração do regime ditatorial, a saber...” Opa! Acho que essa não é a melhor forma de se analisar uma ditadura militar. Aliás, muitos trabalhos, pesquisas e artigos científicos já se preocupam em falar dos fatos que culminaram na ditadura militar e, igualmente, legitimaram por muitos anos o governo dos militares. Mas, então, como explicar um regime totalitário, sem cair num reducionismo, ou mesmo, numa análise, devera às vezes, romanceada? Muitos dos governos daquele período pensavam, utopicamente, que estavam salvando o Brasil, pois era preciso aquele momento de terror. Tudo seria recompensado num período vindouro de nossa história. Para chegar à verdadeira democracia o Brasil tinha que passar por aquilo. Muitos pensavam (e continuam pensando) assim, mas a ditadura trouxe sequelas, até hoje, não cicatrizadas.


São muitas histórias dentro da história. A geração da década de 60 e 70 assistiu um momento de grande efervescência. Os anos rebeldes surgiram como a nova dança mundial da juventude. Anos da pílula anticoncepcional; protestos no Vietnã, dos hippies, dos Beatles, Rolling Stones, de Jim Hendrix e Jamis Joplin; ano do psicodelismo, e por que não falar, da psicanálise de Freud; florescimento das ideias revolucionárias de Marcuse, Althusser, Hermann Hesse. Tempo que foi proibido proibir, na expressão irônica de Sartre. Mas, década de 60, também era a vez de Cuba com Che Guevara e Fidel Castro proclamando a Revolução Cubana. E o Brasil? Para os lá de fora, o Brasil era, simplesmente, mais um país atrasado com um bando de povo mestiço, indolentes, e ainda mais, de índios preguiçosos que não queriam ser escravos, renegando o tão sublime e apreciado trabalho aos moldes europeus.

Calma, essa era a imagem exterior. O Brasil era o Brasil do não. Se de um lado, o Brasil vivia debaixo do sol escaldante e troglodita da ditadura militar. Por outro lado, muitos jovens, diziam não ao regime militar. Era uma revolução dentre da revolução. O tropicalismo de Caetano Veloso e Gilberto Gil invadiu o Brasil. Mas não para por aí. O movimento estudantil - como nunca antes – mostrou-se um poderoso instrumento de contestação. Sim, a juventude queria ganhar o mundo! As passeatas e greves eram proibidas. Vigiar e punir, na voz de Michel Foucault, também estava, inexoravelmente, presente nos aparelhos ideológicos (e repressivos) do estado (sim, com letra minúscula mesmo para repudiar o fetiche dessa máquina, exclusivamente, a serviço dos capitalistas). Mas isso não parava a garotada. Os estudantes iam para as ruas lutar contra o governo que esculhambava a universidade pública e contra o regime militar. A polícia atacava ferozmente. Cassetetes, gás lacrimogêneo, caminhões brucutu eram utilizados para reprimir a sociedade. Os jovens revolucionários respondiam com pedras, bolas de gude e a mais forte de todas as armas: crítica, utópia e política. Isso valia mais do que muitos livros, mais do que dinheiro. Não se perguntavam se as utopias (concretas) eram possíveis, mas perguntavam se a desejamos/queremos como um projeto realizável.

A discussão não se limitava somente nas possibilidades, mas no cerne dos desejos. Portanto, desejar as mudanças já expressa, em seu interior, as possibilidades de sua realização. A luta de classe, e ao lado disso, a consciência de classe mostrava, colericamente, que a (dita) pós-modernidade tinha seus antípodas.

Dentro da história existem muitas outras histórias que, são “ figurantes mundos que enchem o panorama da história e são muitas vezes mais interessantes e mais importantes do que os outros, os que apenas escrevem a história” Em meio a cada jovem que lutava, bravamente, contra ditadura, a história de Wilmar e Laurenice na cidade de Goiânia, capital do Estado de Goiás, destacaram-se.

O dia 12 de julho de 1972 não seria mais um dia normal para os dois. Se bem que, sob uma ditadura a palavra normal de dilui no coração ardente daqueles que anseiam por mudanças. Já estava no crepúsculo da tarde, quando Laurenice esperava, ansiosamente, seu namorado Wilmar no Restaurante Universitário (RU) na Universidade Federal de Goiás (UFG). Dia 12 de julho seria especial para Laurenice, ela estava esperando por uma reunião política naquela noite. Era uma reunião secreta e clandestina. Laurenice iria entrar para o Partidão, o então Partido Comunista. Wilmar, com o sobrenome de Antônio Alves e pseudônimo de Fred, estava fazendo a preparação de sua namorada. Wilmar conhecia muito bem o Partidão, aliás, desde os quatorzes anos participava, assiduamente, do partido. Aos dezenove anos, Wilmar, foi admitido na Rádio Universitária (RU), por meio de concurso, e era noticiarista desde os dezessete anos, antes mesmo de abrir em Goiás o curso de jornalismo. Wilmar, também escrevia para o jornal Tribuna do Oeste e, dirigia nas noites goianas, uma rádio com o boletim da UFG. Mas, Wilmar não queria reproduzir as ideologias da ditadura militar, por isso, escrevia crônicas que eram lidas noutro programa do RU - o Mensageiro. Para ludibriar a censura imposta pela ditadura, ele escrevia em tom metafórico. Simplicidade e o tratamento de temas corriqueiros eram recorrentes nas crônicas de Wilmar.

Mas em 12 de julho não seria mais um dia como todos os outros. Laurenice estava muito ansiosa para jantar sozinha ou esperar pelo seu namorado. Decidiu subir dois lances de escada que os separaram e assistir a transmissão do programa. Minutos depois, um jovem com a aparência de vinte e cinco anos, alto, cabelo curto, vestido com jaqueta e calça jeans, chamou Wilmar e pediu-lhe, cordialmente, que fosse até lá fora para bater um papinho. Wilmar olhou, serenamente para Laurenice e jogou um beijinho. E, depois disso, Wilmar não retornou tão cedo... Os algozes da ditadura o haviam levado para o Cepaigo, estabelecimento onde ficavam os considerados inimigos da pátria. Estando lá escreveu seu último poema declarando, fervorosamente, que lutar por uma sociedade melhor deve ser constante, não importa a situação e o período por mais enevoado que seja. Deve-se, isso sim, permanecer acessa o espírito de luta, igual a labaredas de fogo que dissipam os muitos corações preenchidos pelos icebergs da vida...


Flores no Quintal

As minhas flores, plantadas

(vermelhas, preocupadas)

Lá no fundo do quintal,

Falam de corpo na maca,

Marcado de medo e taca,

Na terra do carnaval.

No ritmo do samba quente,

Como um bater de dentes,

Elas tremem sem cessar.

São Flores encabuladas,

Sensíveis, indignadas

Pelo próprio tremular.

Me fazem sentir no lombo

A dor primeira do tombo

(A rasteira do "porão")

Enquanto a folia, lá fora,

Envolve a gente que chora

A dura falta do pão.

A lembrar que meu recado

Por inteiro não foi dado,

Faltando o grito fatal,

Alertam para o momento

De entoar a todo vento

Do gentio a voz geral.

Da terra da batucada,

Do homem da goleada,

Querem ver um ir e vir

Que o corpo erga da maca

E destrua medo e taca

E deixe a gente sorrir.

Chegará o fim da era

Da vida sem primavera,

Do lombo ardendo em sal;

Virá um tempo diferente

Aos olhos de toda a gente...

E pra flores no quintal...


Sugestões de Leitura:


ALVES, Laurenice Noleto. Wilmar demorou a voltar. In:Salles, Antônio Pinheiro(cord.) A ditadura militar em Goiás: depoimentos para a história. Goiânia: Poligráfica Off-ser e Digital, 2008. (Para baixar: http://www.4shared.com/document/77NN9Lzw/2_Encontro_-_A_Ditadura_Milita.html)


BRASIL. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos. Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007400p. (Para baixar: http://www.4shared.com/document/tVhr89dw/2_Encontro_-_Direito__Memria_e.html)



BITTENCOUR, Circe. Identidade nacional e ensino de História do Brasil. In: KARNAL, Leandro(org), História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. São Paulo: Contexto, 2004.

Viage mais em:

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