terça-feira, outubro 6

Individualista e egoísta, assim caminha a sociedade

Maren Greenpoint

Tem sido agonizante presenciar tanta arbitrariedade num momento em que se acredita testemunhar a existência da democracia. Os extremistas cada vez mais convictos de suas visões fragmentadas, fazendo reinar uma cleptocracia, enquanto continuamos caminhando com medo de olhar pros lados. Aprendendo por indução a manter um ambiente de diplomacia e confiança que já foi quebrado há muito tempo, enquanto cada um tenta garantir sua cota do rombo público.

Nesses momentos é difícil determinar se a raiva vem da própria falta de animo ou da petulância dos escarnecedores. A lei a que todos deveríamos ser fieis perdeu seu sentido no momento em que a vida foi subjugada a um preço. Desde que haja indenização, o crime é apenas uma fatalidade. O capitalismo repetiu sua estrutura valorativa nas diferentes esferas de relação social, reproduzindo injustas e mentiras em nome do ‘laissez faire, laissez passer’ (Deixe fazer, deixe passar, o mundo vai por si próprio).

O liberalismo atingiu seu apogeu num momento em que a ciência já poderia ter nos livrado de inúmeras doenças e vícios. Se não fosse o desejo corrupto de auferir cada vez mais ganhos econômicos, hoje a sociedade poderia desfrutar de outro estágio evolutivo e humanitário. O pior não chega a ser hegemonia por si própria, mas o efeito que produz sobre o inconsciente coletivo, alienando o exercício de direitos fundamentais. As crises perderam seu efeito reflexivo e transformador, se tornaram mecanismos de aceleração do capitalismo.

Quanto mais afundamos sobre os efeitos da monetarização da vida, mais ainda aprofundamos a crise, como se fosse possível resolver o problema de um sistema que nasceu injusto, aumentando sua potência. A realidade está totalmente distorcida em favor do capital. Conquanto somente uma minoria consiga ganhar com a instabilidade, a verdade é manipulada gerando diversas anomalias. Contudo, os rombos só podem ser realizados, porque encontram escudo numa sociedade que esconde de si própria os erros, a falta de respeito e a vaidade.

A bem da verdade, todos contribuímos para a existência e avanço do capitalismo e da corrupção, porque no fundo, acabamos concordando com seu ‘modus operandi’. Seguindo a ideologia da inevitabilidade e naturalização dos desvios corruptos como se fossem inerentes ao sistema econômico e político. De certa forma, a maldade e o poder sempre marcaram a história humana, afastando a ideia de que o homem é bom por natureza.

Apesar do desejo de ser bom, o homem continua celebrando suas fantasias narcisistas secretamente, empurrando para debaixo do tapete o prejuízo das próprias atitudes. No fundo, as contradições ideológicas se complementam demonstrando que ninguém nem nada existe sem um outro diferente. Muitas vezes discutimos por coisas sem importância, muitas vezes partindo para a violência sem atacar o verdadeiro inimigo que está escondido em cada um de nós simultaneamente, pelo pacto social da civilidade.   

Caminhamos enxergando apenas o que está na frente, sabendo também, que ninguém é o que parece ser. Vivendo de acordo com a projeção dos outros sobre nós, insistindo em reproduzir e criar um mundo que não se encaixa na natureza da vida. Espalhando a tendência de ignorar o que cada pessoa tem e é, para conquistar o que não se pode ter e ser. Lutamos desesperadamente contra nós e contra o mundo, para manter um sonho e idealização que jamais poderá ser alcançado.   

Quanto mais nos tornamos obsoletos a realidade real da vida, mais tendemos a mergulhar no mundo das idealizações, projeções e sonhos. Ignorando tudo o que não se adequa as expectativas, tornando-se egoísta por acreditar que é diferente o suficiente para ser excepcional no mundo, por isso, nada mais importa, desde que se consiga, finalmente, alcançar o que jamais poderia ter. A vida real tem sido desconsiderada e banalizada para servir a uma vida superficial que não existe, tornando-nos inimigos de nós mesmos e dos outros, alienando-nos da realidade real, ora compactuando, ora obrigando, a pactuar com a ‘liberdade’ que cada pessoa possui de construir a si própria.

Já há muitos anos ecoa a pergunta sobre até quando iremos acreditar no pecado e pensar que existe bem e mal. Como se houvesse um caminho certo e seguro para definir um bom caráter. Parece que vai demorar muito mais tempo até que possamos satisfazer nossos próprios desejos e instintos sem reagir com discriminação. Levará quantos séculos até que além de tecnologia haja também uma nova consciência de amor e liberdade que não force ninguém a nada?

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