terça-feira, novembro 1

Oceano Interior



 
Eu muitas vezes preciso estar só para visitar um lugar sem endereço. Meditar em alguma coisa que possa me fazer pensar no nada. Ocupar a mente com alguma coisa que a deixe vazia. Ir longe depois de apenas fechar os olhos. Pensar em algo que fale sobre o nada e me levar navegando para bem longe.

Como um bruxo velho que sabe falar a língua da natureza e dos deuses. Que se deita na terra e consegue sintonizar-se com o Mundo. Que sabe sentir a dor das árvores, dos animais e ao mesmo tempo reconhece o tempo de tudo acontecer sem interferir no curso natural das coisas. Cheio de manias e simpatias discretas. Sempre pronto para engolir e fazer afundar embarcações desavisadas.  

Nas tempestades, mesmo que tudo o que quero pareça tão perto, nenhum esforço parece suficiente para alcançar. Não tenho do que me queixar. O que para outras pessoas é motivo de alarde e sofrimento, a mim soa apenas como um simples acontecimento. Sinal da própria falta de sintonia com as raízes que me fixam no chão alimentando da vida e informando a pisada do inimigo a trotar.  

Afastar-me só me leva cada vez mais próximo do que quero, preciso e anseio. Entrega numa bandeja com sorrisos destacados. Tudo porque há um mar dentro de mim que guarda destroços de grandes embarcações naufragadas. Segredos tão antigos que já o deixaram de ser. Quinquilharias e penduricalhos de outras épocas que fazem lembrar do meu poder de criar e destruir.

Ventanias surgem e o furação parece tocar a água para formar um grande e incontrolável tornado. Nesses momentos sinto a necessidade de correr de tudo para que esse tormento de acalme e encontre em si mesmo motivos para acalmar. Daí acontece o fenômeno de retornar à calmaria sem pensar. Pensamentos, idéias e estratégias parecem apenas tubarões saltando sobre o turbilhão de águas torrenciais que organiza ondas se rompendo.

Logo surgem sabres de luz que cortam o céu ressaqueado e ainda nebuloso para tocar o fundo do mar. Garças surgem e cantam voando sob o gigante oceano já colorido pelo colorido que só a luz é capaz de revelar. E sem querer querendo mais uma tempestade se desfaz com o simples propósito de fazer encontrar-me comigo mesmo.

Acho que sou esse mar. Aparentemente calmo. Com águas transparentes, mas até certo ponto pouco confiável. De um azul intenso e profundo, denso e pesado. Vez ou outro eletrizado com os trovões que caem do céu. Uma criança que ignora sua própria natureza, sem distinção do próprio poder. Sem consciência do próprio tamanho.

Sempre reinventando suas profundezas. Mudando destroços de lugar. Cheio de medo de si mesmo. Como um Hércules aprendendo a lidar com a própria força e que sem intenção quebra os cristais finos que o rodeia.

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