domingo, novembro 27

Correr com o Tempo



 
O tempo corre, escorre, vaza com os segundos. Passa mais rápido que o piscar dos olhos, e com ele a chance de fazer. Fazer o que se quer... As chances de viver novas coisas passam nesse instante. A fé no próximo dia é tão frágil quanto a certeza de estar vivo daqui a pouco. O dia começa, termina, o que foi feito de bom? O tempo de uma vida é muito pouco. Como diria Nyemieier, a vida passa num piscar de olhos, parece que nem aconteceu as vezes. Cada experiência is unique. A luz, aquele clima, naquele lugar, com aquelas pessoas, passou, terminou. E na esteira que a vida parece, como numa caminhada, o tempo gasto com as melhores coisas, parecem ser sempre as melhores lembranças. Mas a vida continua acontecendo, como um trem sem freio, só buzina e passa soltando fumaça. O tempo passa e por mais que olho no espelho, vejo poucas diferenças de como era, mas a vida não respeita a opinião de ninguém. Ela incomoda todos, e principalmente os que seguem o sol, porque são os que procuram por luz. A perfeição das pedras penduradas nos penhascos foi dada pelo tempo, da mesma forma, com muitas condições duras, podem chegar ao nirvana os pobres mortais.    

terça-feira, novembro 15

Gotham



 
Todos conhecem ou já ouviram falar sobre a estória do Batman, único super-herói da editora em quadrinhos norte americana DC Comics sem superpoderes, justiceiro vestido de morcego que também encarna o badalado empresário da Wayne Enterprises, na violenta Gotham City, mas muito pouco foi contado sobre sua infância. A forma como terminou de ser educado pelo seu mordomo Alfred até então seguiu um mistério, para isso a nova franquia formulou uma versão que tem chamado a atenção. Seguindo a esteira das grandes produções, a megaprodução conta com um grande time fazendo com que cada episódio tenha o mesmo tratamento dado a filmes. 

O protagonista, diferente do esperado, permanece centrado no detetive Gordon, destemido policial que luta arduamente para promover justiça e limpar a delegacia da corrupção, mesmo que isso termine gerando antipatia frente aos seus colegas de trabalho. Sua missão é colocar a perigosa cidade de Gotham em ordem, combatendo o crime e diversos chefões do tráfico que comandam as zonas da cidade. Durante sua empreitada ele contará apenas com a ajuda do seu parceiro - detetive Bulloc - um típico policial fanfarrão consumido pelo sistema.  

A antiga cidade retratada em diversos quadrinhos, cenário da infância do então adolescente Bruce Wayne, permanece com a mesma aparência melancólica e selvagem para quem já acompanha a saga Batman. As dificuldades e os problemas da cidade são os mesmos que assolam a maioria dos grandes centros urbanos enfrentam, a diferença é a grande insatisfação da população que se sente livre para fazer justiça com as próprias mãos e cometer outras diversas ameaçadas ao bem comum. Essa mesma atmosfera atordoada e de ineficácia das instituições públicas, faz com o próprio hospício da cidade use os pacientes em secretos experimentos científicos.  

Talvez por haver crianças contracenando, os personagens, mesmo os mais cruéis, ganham um toque sedutor, mas bastante previsíveis junto com cenários extremamente visuais variando ora entre ambientes bucólicos, ora entre breves engodos sentimentais com direito a pares românticos e falas que mais parecem provérbios de sabedoria ou pura instrução ao cumprimento do dever. Já em sua segunda temporada a série conseguiu adaptar melhor o roteiro, sempre cheio de novas revelações, à estética e tradição dos quadrinhos com muita aventura em brigas e disputas sangrentas.

segunda-feira, novembro 7

O País da Contradição




Os textos aqui postados em geral se utilizam de muitas metáforas e anedotas figuradas para ter maior elasticidade em alcançar certos assuntos e propor analises mais amplas, sem apontar diretamente um ponto único de discussão. Contudo, comezinho esse discurso de indiferença, diante de todos os acontecimentos que tem marcado os dias com reviravoltas políticas apocalípticas, tornou-se quase impossível não falar da crise que toma conta da conjuntura nacional evidenciando injustiças, e como não falar de toda essa parafernália pseudo high tech e pós-moderna transvestida da conhecida estrutura colonial que entope o cotidiano. Algumas já tão recorrentes que passam batidas, mas que são facilmente observáveis no comportamento naturalizado em sociedade. 

O Brasil é o país da diversidade e da contradição. Na mesma proporção agigantada em que a população se mostra como resultado de um grande caldeirão de miscigenação étnica e cultural pouco comum, demonstra por outro lado uma enorme apatia política. E se por um lado quem exerce ofício político trabalha em média três dias por semana e ainda recebe salário, e que somando todas as gratificações, auxílios e regalias chegam a tornar-se altíssimos, quem dá aula nos municípios não chega a receber o teto salarial, a categoria policial que sai as ruas não tem condições de exercer um trabalho digno e grande parte dos centros médicos públicos padecem. Enquanto os mais pobres pagam tributos maiores do que podem, os milionários se quer recolhem o Imposto sobre Grande Fortunas previsto na Constituição Federal. 

Se por um lado a polícia ameaça e prolifera um ambiente violento de guerra as drogas, por outro, violentam a camada da sociedade da qual eles também fazem parte, reprimindo seus semelhantes para proteger o patrimônio dos ricos. Na prática o que tem acontecido é uma guerra contra a pobreza onde só quem não tem dinheiro cai atrás das grades ou passa por constrangimentos desnecessários, não apenas em relação a defasada tipificação penal de drogas no Brasil, mas contra toda uma camada social e assalariada. Quem olha um país assim tão grande territorialmente e tão rico em recursos naturais, não é capaz de imaginar a pequenez do pensamento político e cultural que predomina e exerce o controle do aparato político estatal. Infelizmente ainda vivemos num típico cenário de faroeste caboclo em que quem é inteligente faz por onde e fica rico do melhor jeito que consegue.

Há ainda um velho e persistente ranço de intolerância que se manifesta sob discursos racistas, preconceituosos, machistas, reflexo de uma elite burra e atrasada. Um discurso repressor e de tom conservador que ignora o fato de que toda família brasileira que se preze, tem alguém que se encaixa no perfil das minorias exploradas e violadas. Uma terra em que celebridades não fazem arte, atores só encenam grandes marcas, cantores tem medo de perder a popularidade, juízes não fazem justiça, políticos não administram o bem público, jornais não informam a verdade, em que existe uma educação limitada e limitadora ensinada.    

Se por um lado a sociedade brasileira acolhe e vende o discurso da igualdade de direitos, dos direitos humanos, ao meio ambiente, a diferença que seja, por outro está mergulhada na hipocrisia de tapar o sol com a peneira e discutir a marginalização de forma marginal propositalmente. Nunca nenhum benefício social foi disponibilizado ao povo sem que houvesse enfrentamentos, resistência e dialogo, mesmo quando militantes puderam assumir o poder, nunca nada foi realmente feito com interesse no benefício popular. Parece já ter sido naturalizado de forma tão profunda e inerente na mentalidade dos brasileiros a ideia de que planejar, executar e avaliar é balela que no final qualquer gambiarra serve.

As paisagens naturais e as belezas tropicais parecem ter causado um atrofiamento mental que sempre legitima o discurso conquistador de quem faz o que quer e porque está feito, não pode mais ser desfeito. Um lugar em que respeitar a ignorância e ser cúmplice do desrespeito se tornou traço cultural, forma de pensar, brincadeira normal que faz todo mundo calar a boca ou sorrir abertamente. Apesar de ser reconhecido como um país rico, entre as dez maiores economias do mundo, o Brasil só será capaz de ser desenvolvido e plenamente rico, quando deixar de fingir acreditar no que fala e manter a coerência com seu discurso; aprender a confiar no seu povo e parar de servir como capitania das elites capturadas pela sua própria vontade de ocupar o papel dos colonizadores.          

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