Para
muitos, amar significa posse. O poder de determinar a vida de outra pessoa e com
isso provar o seu amor. Como se essa disciplina pelo comportamento dos outros
pudesse transmitir compromisso e dedicação a uma relação. Pensar na vida do
outro e persuadir a tomada de decisões pessoais é uma falácia que já provou sua
fragilidade. Cada pessoa acredita no que quer e faz dar certo independente de
ser o mais racional ou melhor para as outras pessoas.
Para
alguns amar vem precedido da ausência de intimidade. Sem autonomia para ter
pensamentos contrários ou agir com autonomia. É tudo devoção. De repente a vida
se confunde com a identidade de outra pessoa, a responsabilidade se torna mútua
e ocorre a transmutação da própria identidade com um outro alguém. Decidir algo
que lhe atinge deixa de ser uma questão intima e passa a ser escolha coletiva. Muitos
se esforçam por esse tipo de relacionamento não porque realmente é eficaz, mas
porque aprenderam que é a única forma de fazer uma relação dar certo.
O
medo de ter opinião em uma relação não significa amor, mas devoção. Uma devoção
que busca atingir os interesses de outras pessoas, um sentimento egoísta de
satisfação individual pela anuência do outro. Por isso casamentos infelizes,
amargos e incompletos se perpetuam mesmo que seus nubentes permaneçam
insatisfeitos e terrivelmente frustrados. A liberdade assusta porque exige que
a cada dia seja necessário um novo limite a desbravar.
Casamentos
nem sempre são referências de um relacionamento saudável, porque desde seu
concebimento não foram pensados como uma forma de permitir o exercício das
vontades pessoais. O que existe é resultado de uma concepção antiga, de quando
os relacionamentos eram apenas forma de ampliar o poder econômico e prestígio
pessoal unindo reinos e dinastias. Essa forma de se relacionar é extremamente
nociva aquela necessidade que toda pessoa tem de se descobrir e se reinventar
no mundo, grande parte de quem se casa se prendem tanto a sonhos de outras
pessoas que se esquecem de sonhar os seus próprios.
Aprender
apenas uma forma de demonstrar afeto limita a percepção de amar e conduz a
perca dos próprios gostos, desejos e interesses. A natureza não segue o
protocolo da civilidade humana. Ocupar o papel feminino ou masculino de uma
relação não determina uma relação amorosa. Amar não se limita ao padrão bíblico
hegemônico. Opostos e semelhantes se atraem e não há predisposição cósmica,
apenas interesse. Pessoas negras, brancas, ricas, pobres, altas e baixas não
precisam seguir uma lista de comportamentos amáveis para alcançar a felicidade.
Os padrões sociais não conseguem atingir a realidade e sua diversidade por
conta de sua superficialidade.
Nem
de longe amar significa apenas palavras de carinho ou noites de amasso. Amar também não significa “ter” ou “ser” de
alguém, muito menos permitir a intromissão de outros em sua vida particular.
Infelizmente a receita bíblica de eterna e irrestrita devoção não é suficiente
para um relacionamento feliz.
Amar
encontra um significado particular para cada pessoa por isso cada pessoa tem
sua forma peculiar de se sentir amada e de demonstrar seu afeto. Atos de amor
são diferentes para cada pessoa da mesma forma que nossa aparência. Dar presentes,
esconder a verdade ou fingir respeito são parte do que algumas pessoas esperam
de quem lhe ama, mas isso é apenas o que é ensinado pela mídia comercial. Amar
é um ato de rebeldia que começa com consigo mesmo e que depois pode ser
direcionado a outras pessoas.
Nascemos
sozinhos, apenas somos adotados pelos nossos pais até a melhor idade para
continuar a caminhada, sozinhos. A dependência é natural, mas alimenta-la com
devoções foge do equilíbrio e rouba parte da própria identidade. Relacionamentos
de amor não roubam, apenas permitem trocas. Não há perca de si mesmo. Não
existe guerra quando se ama. Não há disputa, nem poder.