Estamos vivendo e presenciando um
momento de transição na História da sociedade. Direitos que são negados e
outros que são cada vez mais exigidos. O protagonismo das mulheres, a liberdade
sexual, práticas racistas e desastres ambientais são agendas que clamam por
justiça há muito tempo. Talvez hoje estejamos assistindo o início da mudança,
que apesar dos retrocessos legislativos recentes, não tem sido suficientes para
matar a sede da sociedade por igualdade, solidariedade e respeito.
Mas resta indagar: para onde
estamos indo? Onde essa mudança nos levará? Afinal de contas, que mudança
estamos discutindo? Talvez seja mais urgente discutir a mudança que está
acontecendo e o rumo que ela toma do que as próprias ideias utópicas de mudança.
Todas as pessoas podem ver e entender a mudança, mas cada um enxerga de acordo
com seus próprios interesses e personalidade. Querendo a mudança acontece, mas
a quem ela tem favorecido?
Muitas pessoas cheias de
inspiração e ânimo protagonizam momentos de liderança e libertação que apesar
de emocionantes, nada ou muito pouco conseguem alterar. Certas mudanças, se
feitas sem respeitar o tempo e a própria realidade que deseja mudar, certamente
estarão fadadas a serem controladas pelo que deseja mudar. A mudança capaz de
mudar realmente exige antes o entendimento e conhecimento do que se deseja
mudar.
Embebidos no próprio mal que
queremos ver, entender e vencer, muitas vezes acabamos fortalecendo e
expandindo mudanças que não mudam de verdade. Algumas mudanças só carregam esse
sentido no nome, porque na prática só servem para realçar características e
situações que esperava ter eliminado. Por isso é preciso cuidado sobre a
mudança que você defende e deseja ver implantada.
Certas mudanças são naturais e
inquestionáveis, mas a maioria das mudanças quem faz é o ser humano. E mesmo
que não se deseje mudança alguma, o mundo continuará girando e certamente
teremos que nos adaptar para sobreviver. Mesmo assim é direito de toda pessoa
fazer sua escolha antes que seja escolhido e a partir disso, definir de qual
mudança deseja fazer parte: a que muda de fato ou a que muda somente a
embalagem.
No enfoque das mudanças
produzidas pelo homem, existe uma divisão bastante clara da mudança que certos
grupos querem para o mundo. Os movimentos sociais, militantes e ativistas
desejam fazer a mudança e se esquecem que planejam mudar o mundo dentro do
próprio mundo que desejam mudar. Já os empresários, bancários e políticos
apesar de inovar, nada mudam, troca-se de visual, mas as estruturas continuam
as mesmas.
A verdade é que a mudança tem
perdido seu efeito sobre as ações humanas. Mudamos e mudamos, mas continuamos
os mesmos. Convivendo com medos, manias e hábitos que apesar de
reconhecidamente burros, existem desde o início dos tempos e dominam nossas
práticas cotidianas. A banalização do poder da mudança tem cristalizado
convicções retrógadas e acostumado a mudar a aparência sem modificar as raízes
dos nossos condicionamentos.
As mudanças de hoje só poderão
ser sentidas com o tempo. Talvez as coisas mais loucas sejam as mais lúcidas e
as mudanças que pareciam catastróficas a solução. Da mesma forma que certas
mudanças defendidas apenas reforçam o poder do que se deseja ver alterado.
Quando não houver nenhuma dúvida ou insegurança da mudança que se deseja, tome
cuidado. Grandes mudanças não começam com radicalismos e grandes certezas, mas
sim com ideias simples e pequenos gestos.