quinta-feira, julho 28

O Pau

O pênis é um grande mal no mundo. Um mal opressor que não adormece, atravessando séculos, culturas, civilizações inteiras submetidas ao seu poder. Ele é orgulhoso e impiedoso no topo de seu lugar social. Um tirano que governa disfarçado, adorado por milhões de subalternos ao redor do globo. Símbolo da força que tem garantido tanta prosperidade ao gênero humano.

Não falo do pênis físico, simples amontoado de carne dura, nervos, pele e glândulas, tão igual a qualquer outro órgão do corpo masculino ou feminino. É do pênis simbólico a que me refiro. Uma entidade gigantesca que ultrapassa o limite físico para se instaurar mesmo como parte da psique feminina. Que é medidor de força, de caráter, de importância na sociedade. Ter bolas é mais que possuir dois testículos molengos produtores de esperma. Ter bolas é ter coragem. Ninguém se refere a alguém como “pica grossa” à toa. Culturas não cultuavam falos imensos por simples distração, e assim tem sido desde muito tempo.

A maioria dos grandes personagens históricos tinha pênis. Se não tinham, agiam como se tivessem. O líder da igreja católica é um Papa. As mulheres, em algumas religiões, têm de usar lenços sobre a cabeça na presença de seus maridos, ou homens mais velhos. Deus é homem, bem como Jesus. Adão foi criado primeiro, Eva só veio de sua costela, mas, pensando bem, até que poderia ter sido de outro lugar. A sociedade é patriarcal, e todos sabem o que os pais possuem entre as pernas.

Eis ele em todos os lugares, uma seta apontando direto para nossas fraquezas. E quanto maior, melhor. Quanto mais grosso, mais orgulho terá seu dono. Que arma de fogo tem tanto poder destrutivo quanto aquele pedaço de carne? Aliás, quem empunha a maioria das armas de fogo? A própria moral é masculina, tão machista quanto possível, feita de nervos prontos para se alongarem ao menor sinal de uma presa. Existe algo mais ameaçador que um homem de pau duro?

E talvez eu seja chamada de frígida por dizer isso, porque o prazer dominante também é masculino. O que ensinam às mulheres, senão abrir suas pernas? Esperar pela posse à qual fomos destinadas biblicamente. Ensinam às princesas que esperem por seus príncipes, sãs e salvas nas torres mais altas, preservando a virgindade enquanto o príncipe caça javalis e fode plebéias antes de ir salvá-la. Ensinam às esposas que preservem o lar para seus maridos, pois eles trabalham o dia inteiro e à noite querem recompensa.

Os psicanalistas chegaram mesmo a afirmar que as mulheres têm inveja do pênis. Vale lembrar que a maioria dos psicanalistas à época era bons homens. É claro que ninguém sugeriu a hipótese de um menino querer, no lugar de sua poderosa seta, possuir uma humilde vagina. E ninguém nem mesmo para pra pensar em como seria se, ao invés de bolas, cultuássemos ovários, e no lugar do Rei-Pênis houvesse uma Rainha-Vagina. “As coisas seriam melhores, afinal as mulheres são mais sensíveis”. Bem, pelo menos é isso que sempre disseram sobre elas, porque só as mulheres choram, só elas sentem carinho, só elas se compadecem. Assim tem sido desde tanto tempo que nem podemos lembrar.

E ao homem é exigido ter muitos centímetros. Ou uma circunferência vantajosa. Aqueles que “enchem bem as calças” são alvos de cobiça, seus pais proíbem que eles ajam como “moças”, e se decepcionam-se com suas atitudes, ou se ele é covarde, “até parece que usa saias”. Os homens são vítimas de seus próprios pênis. O machismo também machuca os homens.

E talvez ainda seja por muitos anos até que a mentalidade realmente comece a mudar. Não estou fazendo uma grande análise, apenas desabafando sobre verdades que não dão pra ignorar. O sexo, o prazer, o consumo, o bonito, o agradável, tudo isso tem sido moldado através de valores “penianos” nos quais a mulher é apenas um corpo a ser penetrado. Nos filmes pornôs, não passamos de buracos à espera do precioso esperma. O símbolo da vitória é o braço erguido, ereto. O sinal de positivo é um dedo em riste, cuja origem romana remete à ereção. É pau em tudo que é lugar, dizem que mesmo nos castelos da Disney, e talvez poucos pensem no quanto isso é sufocante.

Vão achar que falei um monte de baboseiras, vão concordar comigo em alguns pontos, vão dizer que sou frígida e adepta a teorias da conspiração, que sou uma feminista louca, reprimida e sem noção, mas imaginem-se num mundo em que ter “pica grossa” não é mérito algum, e quem sabe assim me entenderão.

- "O Pau" é também título de um livro de Fernanda Young, que trata, durante uma narrativa, sobre os mesmos temas que este texto.

sexta-feira, julho 8

Dilemas do amor: Quo Vadis Humanitas?



















Édipo e seu amigo Policarpo estavam conversando sobre o amor, indagavam um ao outro sobre esse sentimento: como os antigos olhavam para ele? Porque amavam? Ou afinal, para que servia o amor? Essas e outras perguntas se faziam presente nas discussões dos jovens Édipo e Policarpo.


Estando na Biblioteca Municipal de sua cidade, os jovens - Édipo e Policarpo - buscavam algum livro que falasse sobre o amor, ou alguma coisa do tipo. Enquanto Édipo buscava fervorosamente questões referentes ao amor, seu amigo, Policarpo, olhava para o tempo, como quem não estava interessado naquela pesquisa.


Édipo, pesquisando nos livros de romances dos séculos XVIII e XIX, percebeu que o amor, na maioria das vezes, não era uma experiência pessoal, autônoma. O casamento, seguido do amor, consumava-se na base de considerações sociais e julgava-se que o amor se desenvolveria depois de efetuado o casamento. E, descobriu que no século XX, surgiu uma nova concepção de amor, que se diferenciou, completamente, de anos anteriores. A felicidade do homem moderno consistia na sensação de olhar as vitrinas das lojas e em comprar tudo quanto esteja em condições de comprar. Da mesma forma, essas relações mercadológicas infiltraram-se nas relações sociais, levando o homem e a mulher a encarar-se da mesma forma.


Para o homem, uma mulher atraente, e, para a mulher, um homem atraente, é, pois o lucro a obter. Atraente, portanto, vem a significar, normalmente, um bom fardo de qualidades que sejam populares e muito procuradas no mercado da personalidade. Assim, duas pessoas se apaixonam quando sentem haver encontrado o melhor objeto disponível no mercado, considerando as limitações de seus próprios valores de troca.


Édipo ficou bastante triste quando tais pensamentos vieram a sua mente. O amor, aquele amor do qual pesquisava com tanto afinco, tornando-se mero e simples objeto de compra e, por vezes, de venda.


- Édipo, vamos embora, ainda temos que ir ao cinema - falou Policarpo tentando chamar à atenção de Édipo e acabar com aquela conversa chata sobre amor.


-Sim, Policarpo. Já estou indo - respondeu Édipo.


Estando no cinema, Édipo, começou a refletir sobre o filme de amor que se passava. Viu como estava abarrotada a sala de cinema, tinha muitas pessoas, era como se todos estivessem procurando algo a mais, do que assistir um simples filme. Notou - em decorrência da mudança súbita do amor no século XIX - que os filmes de cinema, contos amorosos de revistas e canções de amor, encontravam satisfação, por parte dos consumidores. Homem e uma mulher que são incapazes de chegar a penetrar a parede da separação naquela pequena sala de cinema comovem-se até às lágrimas caírem. Para muitos assistir aquele filme significava uma única ocasião em que experimentavam o amor, não entre si, mas juntos, como espectadores do amor alheio. O amor, naquele momento, se tornava um sonho acordado.


Mas e quando o filme acabar junto com as histórias de amor, e o que tiverem não for suficiente para encobrir essa lacuna no homem e na mulher, o que eles vão fazer? Quando voltarem à realidade das relações entre duas pessoas?


Além de perceber os subterfúgios que o homem (tentava) criar para encapuzar sua solidão. Édipo reconheceu que a falta de amor levou o homem a criar inúmeras fórmulas efêmeras para acabar com sua tristeza. A presença do amor poderia, se não acabar, minimizando a dor existencial da humanidade.


Logo que saiu do cinema, Édipo, ao olhar o mundo a sua volta, sentiu um grande ceticismo entrar em seu coração. Era como se o amor tivesse uma longa jornada a sua frente e que sem o amor a humanidade não poderia sobreviver.


O amor - pensou Édipo - é um desafio constante para todos, não é um lugar de repouso, mas lugar de mover-se, crescer, trabalhar conjuntamente. Haja harmonia ou conflito, alegria ou tristeza, o amor deve ser à resposta amadurecida ao problema da existência. Deve, igualmente, ser a força ativa no homem, a força que irrompe as paredes que separam o homem de seus semelhantes e que o une aos outros. Que o leva a superar o sentimento de isolamento e de separação, permitindo-lhe, porém, ser ele mesmo, reter sua integridade. É um processo de erguimento e não uma queda. Mas, diante de tantos desafios impostos à humanidade, o amor poderia prevalecer?

Sem falar nenhuma palavra, Édipo, pensou com sigo próprio: Para onde vai a Humanidade?

Quo Vadis Humanitas?



Referências Bibliográficas:


ALENCAR, Francisco. História da Sociedade Brasileira. Rio de Janeiro: Ao livro Técnico,1996.


FROMM, Erich. A Arte de Amar. São Paulo: Martins Fontes, 2006.

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