Existem muitas ideias
erradas sobre a morte e isso faz com que quase ninguém fale sobre esse assunto
sem se corroer de medo e aflição. E também não faltam bordões sobre a morte,
máximas como “ninguém voltou para contar”, ou “para morrer basta estar vivo”, tem
ainda “a única certeza que se tem nessa vida é a morte”. De modo geral existe
um pânico e uma fobia quando se fala sobre o dia em que não estaremos mais
aqui, tamanha a aflição causada por esse assunto que se tornou um tabu, uma parte
obscura da breve experiência humana sobre o planeta Terra, pensar e falar sobre
a morte.
A cultura ocidental religiosa
e a tradição naturalizaram a concepção de que a morte deve nos encontrar numa
idade avançada, que aconteça sem dor, sem sofrimento, de preferência depois de
já se ter conquistado muitas coisas e realizado muitos sonhos. Para muita gente
que crê, a vida humana é tão mais especial que a dos outros animais, que depois
de morrer nossas almas retornam a este mundo de outras formas, que dependendo
da forma como vivemos depois de morrer iremos para um lugar bom (Céu) ou ruim
(Inferno), ou ainda que simplesmente a vida é o que se vive enquanto se está
vivo, não existe nada depois disso.
Ninguém gosta de falar
sobre a morte, talvez porque ninguém realmente entenda ou saiba o suficiente
para dar alguma opinião convincente que tranquilize o nosso próprio ego,
contrariando a expectativa de que essa vida um dia pode acabar. Outra coisa
perturbante quando se tenta falar sobre morte é a sensação de que existe ou
deveria existir um momento certo para a despedida. No entanto, assim como a
vida, a morte é totalmente imprevisível e nem sempre pode ser explicada de
forma racional ou progressiva como se houvesse um motivo que justifique seu
acontecimento.
De fato, a única certeza
é que lentamente ou não, caminhamos para o fim de nós mesmos. Desde o nascimento
já sabemos o que nos aguarda e a morte não deveria ser ritualizada da forma
negativa como geralmente se tem feito. A origem e o fim de uma vida fazem parte
do mesmo processo, compõem a mesma dinâmica, são faces opostas de uma mesma
moeda, completam o ciclo da vida e da experiência nesse mundo. Saber que essa
vida não é eterna nos obriga a aceitar que não adianta acumular bens materiais
ou achar que alguém é capaz de superar o efeito do tempo ou das circunstâncias sobre nossos corpos,
tudo tem seu tempo.
Incomoda o recorrente esoterismo quando se trata da morte. Existem tantas histórias
bonitas de nascimentos, mas nunca se ouve falar sobre histórias de uma bela e
abençoada morte. A morte é sempre recebida com sentimentos de confusão,
rebeldia, angústia e por uma enorme sensação de impotência. Poucas pessoas
conseguem aceitar a morte por um viés bom, perceber que nem só a sobrevivência
e a sua continuidade fazem parte da vida. Cada dia de vida deve ser vivido
sabendo que caminhamos para a morte – que a qualquer momento – por motivos fúteis
ou não estaremos partindo.
O desespero, a impotência
e a comoção generalizada por causa da morte só alcançam quem sabe que não viveu
da melhor forma, que deixou de aproveitar bons momentos com outras pessoas
porque estava mais dedicado/a a materialidade dessa vida do que a temporalidade
da existência. Se alguém está vivo, esse alguém está caminhando para a morte e
não muito diferente do nascimento, esse momento deveria ser recebido
com o mesmo sentimento de êxtase e realização. Só morre bem quem vive sabendo
que vai morrer e não tem medo de viver.
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